A Participação na Eucaristia com a Assembleia dos Fiéis

07 de Maio de 2024

"A Participação na Eucaristia com a Assembleia dos Fiéis"

A Iniciação Cristã daqueles que foram batizados e crismados se conclui com a celebração da eucaristia. Sobre a unção crismal não existe um consenso universal e dependerá do momento histórico. Quando a Igreja cresce e aparecem as comunidades paroquiais, este sacramento vai sendo reservado para o bispo em um momento que esteja presente. Tendo concluído os ritos no batistério, com suas vestes brancas e velas acesas, tem início uma procissão para o local em que está acontecendo a celebração com a comunidade dos fiéis, neste tempo de paz, uma igreja. Onde a comunidade está reunida em vigília pascal. Os fiéis permaneceram em oração pelos que estavam sendo iniciados. Ao longo da noite, realizaram os ritos que compõem a primeira parte da nossa missa: ouviram as 12 leituras preparadas para essa noite, cantaram salmos, ouviram homilias e comentários, até o momento de receberem os neófitos.

A entrada na assembleia dos fiéis é revestida de um caráter solene. Durante o trajeto e no momento da entrada, cantam-se salmos que inspiram essa caminhada para a eucaristia. Gregório de Nazianzo nos informa a respeito desse rito da Igreja de Constantinopla: “O canto dos salmos com o qual tu serás recebido, é o preludio dos hinos que lá se cantam. As velas que carregarás nas mãos são o sacramento das luzes do alto com as quais iremos ao encontro do Esposo” (Oratio 40; PG 36, 425). Em Milão, cantam-se particularmente os salmos 43 (42) e o 23 (22), eles servem para expressar essa caminhada em direção à eucaristia:

“Lavado e com ricos ornamentos, o povo avança para os altares de Cristo, dizendo: ‘Entrarei até o altar de Deus, ao Deus que alegra a minha juventude’ (Sl 42,4). Depondo os despojos do antigo erro, sua juventude é renovada como a da águia, e se apressa para aproximar-se desse banquete celeste. Vem, portanto, e vendo o sacrossanto altar preparado, exclama: ‘Preparaste à minha frente uma mesa’. É esse povo que faz Davi falar, quando ele diz: ‘O Senhor me apascenta e nada me faltará; ele me colocou num pasto. Ele me conduz até à água que me reconforta’. E mais abaixo: ‘Ainda que eu ande na sombra da morte, não temerei o mal, porque tu estás comigo. Teu cetro e teu cajado me sustentaram. Preparaste diante de mim uma mesa bem à frente dos que me afligem. Ungiste a minha cabeça com óleo, e como é excelente a tua taça inebriante!’ (Sl 22,5,1-2.4-5)” (AMBRÓSIO. Sobre os Mistérios 8. 43).

Aos neófitos era preparado um lugar especial na igreja ou na sala em que se celebrava a eucaristia. Eles deverão ter uma visão privilegiada do que se realizará no altar. Não apenas nessa noite, mas também nos dias que se seguirão, nos quais ouvirão as homilias, ou seja, as catequeses mistagógicas, Quando terminarem as catequeses, na oitava da Páscoa, eles tirarão a veste branca e se misturarão com os outros fiéis. Agostinho os coloca em volta do altar. O modo como se dirige a eles em seus Sermões para a Páscoa, deixa isso muito claro. Mas o local pode variar de acordo com a arquitetura da igreja. Na África, região de Agostinho, o altar está quase no meio da nave central. Já no Oriente, está próximo dos degraus que dão acesso à nave central. Em ambas as situações, os neófitos estão sempre próximos do altar. Agostinho explica o motivo dessa proximidade do altar: é para que os neófitos possam observar o que ali acontece.

“O que estais vendo, caríssimos, sobre a mesa do Senhor é pão e vinho; mas este pão e vinho se convertem no corpo e sangue do Verbo quando se lhes aplica o verbo” (AGUSTÍN. Sermão 229 = Denis 6).

Quando os neófitos chegam, já transcorreu toda a primeira parte da celebração. É aquele momento em que os simples catecúmenos deixam a celebração. É a primeira vez que eles participarão desses ritos e poderão tomar a eucaristia. Compreende ainda três partes principais: o ofertório, que é uma preparação; o sacrifício eucarístico propriamente dito, constituído por uma longa prece de ação de graças pronunciada sobre o pão e o vinho; e a distribuição à comunidade dos fiéis.

“Hoje temos que falar ainda, desde este altar de Deus, sobre o sacramento do altar aos recém-nascidos. Explicamos-lhes o mistério do símbolo, ou seja, o que devem crer; o mistério da oração do Senhor, isto é, como devem pedir; e também o sacramento da fonte e do batismo. Tudo isso o escutaram quando lhes foi explicado e o receberam quando lhes foi dado; mas ainda não ouviram nada sobre o sacramento do altar sagrado que hoje viram pela primeira vez. Devo, portanto, pregar-lhes hoje sobre ele” (AGUSTIN. Sermão 228,3).

Agostinho chama os neófitos de “infantibus”, palavra de onde deriva a nossa “infância” e, por isso, costuma ser traduzida por “recém-nacidos”. O próprio Agostinho o explica: “Os que até a pouco recebiam o nome de competentes, agora se chamam infantes. Dava-se lhes o nome de competentes porque com sua petição sacudiam as entranhas maternas para nascer; se lhes chama infantes porque acabam de nascer para Cristo os que antes tinham nascido para o mundo”. E se dirigindo à comunidade dos fiéis, continua: “Nasceu neles a vida, que em vós deve ter já sólidas raízes. Vós que já sois fiéis, dai-lhes exemplo; mas não exemplos que conduzam à morte, senão exemplos que lhes sejam de proveito” (AGUSTIN. Sermão 228,1).

Os santos padres irão comentar para os neófitos os ritos e símbolos da eucaristia. Sobretudo a grande prece eucarística. São as chamadas catequeses mistagógicas, literalmente, condução para dentro do mistério, ou, introdução aos mistérios. Atualmente, essa palavra é usada em um sentido bastante genérico: “explicação dos ritos litúrgicos” (MAZZA 2020, p.17). É nesse sentido que hoje se aplica, por exemplo, à preparação para o sacramento do matrimônio. Muitas dessas catequeses chegaram escritas até nós, inteiras ou em partes. São elas que nos fornecem as informações sobre a iniciação cristã na Antiguidade. Na citação acima, de Agostinho, Sermão 228,3, o vemos descrevendo o processo de formação dos competentes: a transmissão e explicação do Símbolo; da oração do Senhor; do batismo.

Aos santos padres, lhes agradava sobremaneira, descrever com afeto aos neófitos os gestos da comunhão. A eucaristia é ainda um pedaço de pão comum. E todos tomam também do cálice. O pão ázimo foi introduzido por volta do século VIII e somente a partir do século XI será introduzida a “partícula”, como a temos. Com essa mudança na forma da eucaristia, aos poucos vai aparecendo o costume da comunhão na boca e, posteriormente, de joelhos. Os fiéis também não comungarão mais do cálice. Nos séculos que estamos trabalhando, todos os fiéis comungam em pé, do corpo e sangue do Senhor. Já apresentamos um texto de Cirilo de Jerusalém (Cat. Mist. V,21-22). Podemos ler uma explicação carinhosa de Teodoro de Mopsuéstia:

“E. pelo fato de suas duas mãos estarem igualmente estendidas, reconhece verdadeiramente a grandeza desse dom que vai receber. ‘É a mão direita que se estende para receber a oblação que é dada; mas por baixo dela se põe a esquerda’, e, por isso, se mostra uma grande reverência; se aquela está estendida num plano mais elevado, é em vista de receber o corpo real que ela está estendida, ao passo que a outra sustenta e conduz a sua irmã e companheira, não considerando injúria desempenhar o papel de serva para aquela que lhe é igual em dignidade - e isso por causa do corpo real levado por ela.

‘Ao distribuir a oblação, o pontífice diz: O corpo de Cristo’. Esta palavra te encoraja a não se ater às aparências, mas a considerar em teu coração o que se tornou o pão oferecido: pela vinda do Espírito Santo ele é o corpo de Cristo. Tu deves, portanto, apresentar-te com respeito e amor: com respeito pela sua dignidade, com amor, por causa da graça. ‘É, por isso, que tu dizes depois dele: Amém’. Pela tua resposta, tu confirmas a palavra do pontífice e a assina. ‘E o mesmo é feito para o cálice’.  (THÉODORE DE MOPSUESTE. Deuxième Homélie Sur l’Eucharistie 28-29).

Em algumas Igrejas, juntamente com a comunhão, recebiam também uma mistura de leite e mel, sinal da Terra Prometida. Tertuliano e Hipólito o testemunham. E João, o Diácono, o comenta como é realizado em Roma ainda no século VI. Os que foram batizados, “atravessaram o Jordão”, que agora simboliza a ressurreição; são herdeiros da promessa e podem provar na eucaristia o início de sua realização (Sl 119,103).   


Artigo do Pe. Luiz Antonio Belini, colunista do Jornal Servindo