O catecumenato sempre teve como preocupação a formação integral dos novos membros que eram iniciados na fé cristã. À dimensão doutrinal, apresentada sobretudo pela transmissão do Símbolo de Fé, o Creio, em sua Entrega e Devolução, seguia-se, em muitas Igrejas, a Entrega da Oração do Senhor, ou seja, o Pai-Nosso, oração por excelência do cristão. Era, na verdade, nas Igrejas antigas, uma oportunidade de introduzir aqueles que se preparavam para os sacramentos da iniciação na vida de oração. Mais do que ensinar a oração do Pai-Nosso, ensinava-se a cultivar a vida de oração. Nós diríamos, atualmente, a cultivar uma rica e profunda espiritualidade.
“É essencialmente uma iniciação à oração, pela qual os candidatos voltam-se para Deus, chamando-o de Pai. Vemos uma catequese estreitamente unida à história da salvação. A entrega do Pai-Nosso faz, de cada cristão um filho que tem a audácia de falar com Deus como falava Jesus, e deve fazer do Pai-Nosso, a oração do Reino, o ideal de sua vida”
(NUCAP, Celebrações da Iniciação à Vida Cristã. São Paulo: Paulinas, 2018, p.69)
Um dos testemunhos da entrega do Pai-Nosso aos catecúmenos é Teodoro, bispo de Mopsuéstia, cidade da Cilícia, não muito distante de Tarso, na atual Turquia, de 392 até sua morte, em 428. Ele nasceu por volta do ano de 350, em Antioquia, cidade com um histórico rico de lembranças cristãs. Segundo os Atos dos Apóstolos, foi ali que os discípulos de Jesus foram chamados pela primeira vez de cristãos (11,26). Provavelmente também ali foram redigidos o Evangelho de Mateus e a Didaqué. Antioquia é, portanto, a segunda pátria dos cristãos, depois de Jerusalém. Antioquia era importante também para o Império Romano, sendo a terceira cidade em grandeza, depois de Roma e Alexandria. Era próspera e muito viva culturalmente. Foi ali que aos 20 anos recebeu o batismo e por volta de 383 foi ordenado presbítero, depois de uma intensa experiência de vida monástica, estimulado por João Crisóstomo, seu companheiro de fé e de dedicação à pregação do Evangelho.
Felizmente, de Teodoro, nos chegaram suas homilias catequéticas. Não em sua língua original, o grego, mas em sua versão siríaca. Essas homilias são um esplêndido exemplo de equilíbrio doutrinal e de senso pastoral, que fazem de seu conjunto um dos documentos mistagógicos mais ricos e interessantes da antiguidade cristã. Sem contar que nos chegaram completas, coisa rara.
As Homilias Catequéticas de Teodoro são, na verdade, um conjunto de dezesseis textos: dez homilias dedicadas a comentar o Símbolo de Fé e seis homilias dedicadas ao comentário do Pai-Nosso, ao Batismo e à Eucaristia. Interessa-nos aqui a décima primeira homilia, justamente dedicada ao nosso tema, uma apresentação especialmente voltada aos catecúmenos, mas também a outros participantes, do Pai-Nosso. Ocasião para Teodoro trabalhar além do Pai-Nosso, a própria vida de oração. Vários elementos internos ao texto levam os especialistas a afirmarem que são homilias realmente pronunciadas e, muito provavelmente, durante seu sacerdócio, entre 383 e 392, em Antioquia, ao longo da quaresma, sobretudo nos últimos dias. Certamente as tenha pronunciado também, muitas vezes, ao longo de seu episcopado, em Mopsuéstia. Isso fica claro já pelo início da nossa homilia:
“Pela graça de Deus, ontem terminamos de falar daquilo que se refere à fé que, segundo as palavras das divinas Escrituras, os nossos beatos pais estabeleceram para nosso ensinamento, para instruir-nos segundo a tradição do nosso Senhor, no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Hoje, então, é bom que digamos quanto é necessário [saber] sobre a oração que o nosso Senhor nos transmitiu” (Teodoro de Mopsuéstia. Comentário ao Pai Nosso, n.1)
Para Teodoro, o Pai-Nosso não é simplesmente uma fórmula de oração para ser memorizada e repetida. É muito mais uma espécie de itinerário pelo qual o batizado aprende a viver sua fé. Assim como o Credo nos introduz “no temor de Deus e em um conhecimento correto da fé”, o Pai-Nosso nos ensina “o que é necessário para adequar a vida aos mandamentos divinos”. E conclui: “Toda oração, de fato, qualquer que ela seja, é um ensinamento sobre a vida” (n.1).
Rezar para aprender a viver! Existe, portanto, para Teodoro, uma estreita relação entre oração e vida. Mais do que repeti-la, é preciso meditá-la. Mais do que nos ensinar a pedir alguma coisa, a oração de Jesus nos ensina o que é lícito desejar e buscar. Assim, as breves palavras do Pai-Nosso nos são dadas como parâmetros para nossa existência. Com elas devemos avaliar nossos sentimentos e ações. Viver e amar se aprende rezando!
Estando a oração tão estreitamente ligada às condutas, ao comportamento, Teodoro deixa esta regra: “aquilo que não é oportuno esperar que aconteça, não é nem mesmo conveniente pedi-lo em oração” (n.3). Pedir a Deus algo que vai contra um de seus mandamentos seria “pior que a morte por apedrejamento”. “A verdadeira oração consiste então na retidão das condutas, no amor por Deus e na assiduidade naquilo que é agradável a Deus” (n.3).
Teodoro insiste ao longo de sua homilia na brevidade da oração do Pai-Nosso e na simplicidade de suas palavras. Jesus quis deixá-la acessível a todos. Todos podem compreendê-la e praticá-la.
“Ele utilizou poucas palavras para recordar que a oração não consiste em palavras, mas muito mais em comportamentos, amor e assiduidade naquilo que convém. Aquele, de fato, que está disposto a praticar o bem, precisa se dedicar ao longo de toda a sua vida à oração, que se torna visível através de sua escolha de praticar o bem” (n.3)
Seria um equívoco, no entanto, pensar que pela insistência na união da oração com a ação, Teodoro dissolvesse a oração na ação. Assim como temos prazer em encontrar e passar nosso tempo com quem amamos, do mesmo modo, aqueles que amam a Deus buscam encontrá-lo e passar seu tempo com ele. Lembra o exemplo de Paulo, que exorta a rezar sem cessar (1Ts 5,17) e o próprio Senhor Jesus que nos deixou um exemplo de vida e de conduta, sendo particularmente assíduo na oração, passando o dia ensinando o que era necessário e reservando a noite para a oração. Mas Teodoro entende a oração mais como encontro que repetição de fórmulas. Embora o Pai-Nosso ocupe uma posição de destaque, a própria vida se torna conteúdo da oração. Por fim, um conselho valioso para os nossos dias tumultuados:
“E é por isso que Ele ia ao deserto: para ensinar que aquele que reza deve estar livre de tudo, para que o olhar de sua alma esteja voltado para Deus, esteja fixo nele e não seja atraído por mais nada. É, por isso ainda, que Ele escolhe tempos e lugares: para que longe de qualquer perturbação, nós nos precavêssemos do que é ocasião para a alma de preocupação e agitação, e daquilo que por vezes, mesmo sem que ela o queira, a distraia de quanto há em mente” (n.2)
No Servindo do mês que vem nos deteremos em alguns detalhes da explicação do Pai-Nosso feita por Teodoro aos catecúmenos.
Artigo de Padre Belini, colunista do Jornal Servindo