Santo Agostino provavelmente seja o santo Padre que nós melhor conhecemos. Tanto sua vida como seu pensamento. Sua produção literária é enorme e nos chegou quase em sua totalidade. É uma das pessoas mais influentes e estudadas na Igreja e na cultura ocidental. Será também no que se refere à iniciação cristã. Nasceu em Tagaste, Numidia, onde hoje é Argélia e Tunísia, norte da África, em 13 de novembro de 354. Seu pai, Patrício, tinha um cargo no governo romano local e só se aproximou da Igreja no fim de sua vida, recebendo o batismo pouco antes de morrer. Ao contrário, sua mãe, Mônica, era uma cristã fervorosa e sempre fez de tudo para que o filho também fosse cristão ardoroso.
Entre 397 e 398, Agostinho irá escrever uma autobiografia: Confissões. Esta obra é nossa fonte principal para a primeira parte de sua vida. Através dela sabemos como Agostinho vivenciou a experiência catecumenal. Ainda que de forma indireta e esquemática, ele nos informa que havia o costume de receber na Igreja os recém-nascidos com uma pequena celebração. Tornavam-se a partir daquele momento seus membros como catecúmenos. Devemos nos lembrar que estamos em meados do século IV e, portanto, a Igreja já goza da paz de Constantino e do incentivo dos imperadores.
“Eu tinha ouvido falar, ainda criança, da vida eterna a nós prometida, graças à humildade do Senhor nosso Deus, que desceu até a nossa soberba. Fui marcado pelo sinal da cruz e recebi o sal divino, apenas saído do seio de minha mãe, que em ti depositava todas as suas esperanças” (Confissões I,11,17)
Agostinho menciona também do uso de batizar crianças, ainda que seja por emergência. De fato, o costume era protelar ao máximo o batismo, já que ele apaga os pecados passados e não se tinha em perspectiva uma teologia da reconciliação como a atual. Sendo assim, o batismo era deixado para quando o catecúmeno tivesse adquirido estabilidade moral e religiosa. Alguns protelavam mesmo até o momento em que visse sua vida em perigo.
“Senhor, tu viste que eu, ainda criança, fui um dia tomado por febre alta, motivada por uma disfunção do estômago, e estive às portas da morte; tu viste, Senhor, pois já então eras o meu protetor, com que ardor e com que fé implorei à piedade de minha mãe e de nossa mãe comum – a tua Igreja – o batismo de Cristo, meu Deus e Senhor. (...) Eis que improvisamente melhorei. Essa purificação foi então adiada, como se fosse inevitável que, vivendo, devesse continuar a corromper-me, sem dúvida porque se pensava que a responsabilidade pelas faltas cometidas depois do batismo é ainda mais grave e perigosa” (Confissões I,11,17)
Quando convertido e escrevendo as Confissões, Agostinho afirma que ainda se tem este costume. Agora, no entanto, ele tem um bom argumento: “... ainda hoje ouvimos dizer deste ou daquele: ‘Deixe que ele faça o que quiser: ainda não foi batizado!’ Mas, em relação à saúde do corpo, não dizemos: ‘Deixe que se fira mais, pois ainda não foi curado!’” (Confissões I,11,18).
Ao crescer, Agostinho irá se afastar da religião da mãe. Como os jovens com quem convive, é arrastado pelos espetáculos teatrais e pela busca de prazer (Confissões III,2.3).
Quando leu o Hortênsio de Cícero, uma obra que não chegou até nós, começou a se interessar pela filosofia. Resolveu então dedicar-se também ao estudo das Sagradas Escrituras, mas seu orgulho e a busca de uma explicação pautada no que entendia ser a racionalidade profunda de tudo, o afastou ainda mais, sobretudo em relação ao Antigo Testamento: “O que senti nessa época, diante das Escrituras, foi bem diferente do que agora afirmo. Tive a impressão de uma obra indigna de ser comparada à majestade de Cícero. Meu orgulho não podia suportar aquela simplicidade de estilo. Por outro lado, a agudeza de minha inteligência não conseguia penetrar-lhe o íntimo. Tal obra foi feita para acompanhar o crescimento dos pequenos, mas eu desdenhava fazer-me pequeno, e, no meu orgulho, sentia-me grande” (Confissões III,5,9). Agostinho irá aderir ao maniqueísmo, que ele entende, nesta época, ser uma explicação superior da realidade, principalmente sobre a origem do mal. Em vão insistirá sua mãe e os emissários que ela envia-lhe para dissuadi-lo, como o de um bispo que procura convencê-lo de seu erro, mas acaba se frustrando com a resistência de Agostinho (Confissões III,12,21).
Embora Agostinho já tivesse se desencantado com o maniqueísmo em Roma, a mudança veio quando se transferiu para Milão com sua concubina e o filho, Adeodato. Havia conseguido uma cátedra de retórica nesta cidade. O bispo, Ambrósio, já gozava de fama e Agostinho confessa que ia escutá-lo por causa de sua eloquência. Nesta época, os catecúmenos participavam da primeira parte da celebração, o que chamamos de liturgia da Palavra: “Comecei a estimá-lo, a princípio não como mestre da verdade, mas como homem bondoso para comigo. Acompanhava assiduamente suas conversas com o povo, não com a intenção que deveria ter, mas para averiguar se sua eloqüência merecia a fama que gozava, se era superior ou inferior à sua reputação. Suas palavras me prendiam a atenção. Mas, o conteúdo não me preocupava, até o desprezava” (Confissões V,13,23). Com o tempo, no entanto, o conteúdo também passou a interessar, e Agostinho percebeu que as teses propostas pela Igreja não eram tão absurdas como pensava: “... via resolverem-se uma a uma as dificuldades de várias passagens do Antigo Testamento que, tomadas ao pé da letra, me tiravam a vida” (Confissões V,14,24). Decidiu então levar a sério a caminhada catecumenal. A conversão definitiva estava próxima.
Escrito por: Pe. Luiz Antônio Belini