O sinal da cruz

12 de Stembro de 2022

"O sinal da cruz"

 Iniciamos a celebração do batismo pelo sinal da cruz. Em geral, pais e padrinhos traçam o sinal da cruz no batizando. Ao longo da celebração, o celebrante também o fará por várias vezes. O Ritual da Iniciação Cristã de Adultos (RICA), concretizando o pedido do Concílio Vaticano II de restaurar o catecumenato de adultos para os sacramentos da iniciação, propõe uma Celebração da Entrada no Catecumenato centrada no sinal da cruz. Este primeiro sinal alcançará sua perfeição com a última assinalação, com o crisma do Espírito Santo (NUCAP 38). Mais do que a entrada em um "curso", representa já a admissão na Igreja.


         "Desde então os catecúmenos, cercados pelo amor e a proteção da Mãe Igreja como pertencendo aos seus e unidos a ela, já fazem parte da família de Cristo: são alimentados pela Igreja com a Palavra de Deus e incentivados por atos litúrgicos. Tenham a peito, portanto, participar da liturgia da Palavra e receber as bênçãos e os sacramentais" (RICA 18). Tem direito a casamento e exéquias cristãs.


         Nesta Celebração da Entrada no Catecumenato, o RICA propõe uma breve explicação do sinal da cruz. Quem preside diz: "vou marcar vocês com o sinal da cruz de Cristo, que é o sinal dos cristãos. Este sinal vai daqui em diante fazer que vocês se lembrem de Cristo e de seu amor por vocês" (n.83). Com a assinalação na fronte, lembra ao candidato, que ele está sob a proteção de Cristo, e que este é o sinal de seu amor ou de sua vitória. Termina exortando: "Aprende a conhecê-lo e segui-lo". Em seguida acontece a assinalação dos sentidos (n.84). Traça-se o sinal da cruz nos ouvidos ("para que vocês ouçam a voz do Senhor"); nos olhos ("para que vocês vejam a glória de Deus"); na boca ("para que vocês respondam à palavra de Deus"); no peito ("para que Cristo habite pela fé em seus corações"); nos ombros ("para que vocês carreguem o jugo suave de Cristo"). Como rito auxiliar, o RICA incentiva a entrega de uma cruzinha para por no pescoço, "em recordação da assinalação" (n.89). Em seguida, ingressam na Igreja para a liturgia da Palavra de Deus.


         O sinal da cruz é realmente um dos sinais mais conhecidos do cristianismo. Mas não só. É também um dos mais antigos. Pode estar já ligado à própria Igreja Apostólica. É o que afirma, por exemplo, Basílio de Cesareia. Em sua obra Tratado Sobre o Espírito Santo, escreve: "Entre as verdades conservadas e anunciadas na Igreja, umas nós as recebemos por escrito e outras nos foram transmitidas nos mistérios, pela Tradição Apostólica. Ambas as formas são igualmente válidas relativamente à piedade. (...) Por exemplo (para relembrar o que vem primeiro e é o mais comum), quem ensinou por escrito a assinalar com o sinal da cruz aqueles que esperam em nosso Senhor Jesus Cristo?" (c.27 §66). Nesse texto, que por outra fonte sabemos que é do ano 375, Basílio nos confirma três ideias fundamentais a respeito do sinal da cruz: sua origem apostólica e, portanto, antiguidade e seu caráter comum. Mas teria realmente o sinal da cruz feito parte já da tradição apostólica? Jean Danièlou, estudioso do tema, pensa que seja possível.


         Temos farta documentação para afirmar que na virada do século IV para o V já encontramos o uso generalizado do sinal da cruz. Sua origem deve estar ligada ao sacramento do batismo. Ele sempre aparece acompanhando o rito batismal, embora seu lugar na cerimônia possa variar. Pode aparecer no início do catecumenato, como acabamos de ver proposto pelo RICA (é o caso atestado pelo Pseudo-Dionísio); ou entre renúncia a satanás e o batismo (Teodoro de Mopsuéstia); após o batismo, que parecia ser o mais comum, por estar associado a unção crismal (testemunhado por Cirilo de Jerusalém e Ambrósio). Mas o rito da assinalação com a cruz podia ser repetido ao longo da iniciação cristã, como é atualmente no caso da liturgia romana.


         Da Igreja em Roma temos o testemunho de Hipólito. Ele o descreve em sua obra Tradição Apostólica. Não sabemos bem datá-la, mas Hipólito deve ter morrido mártir por volta de 235; esta obra reflete, portanto, o costume da Igreja romana no início do século III. Segundo ele, o sinal da cruz era feito nos catecúmenos pelo bispo no início de uma longa celebração que se concluía com o batismo propriamente dito: "Depois de marcar-lhes com o sinal da cruz a fronte, os ouvidos e as narinas, ele os fará levantar-se" (§44). Os catecúmenos estavam de joelhos. Observamos aqui a assinalação dos sentidos.


         Quando mais tarde os ritos batismais se desenvolveram, a celebração com a imposição do sinal da cruz aos catecúmenos se tornou o primeiro rito e a expressão de uma primeira consagração a Cristo. Agostinho em suas Confissões conta como foi marcado pelo sinal da cruz na testa, por sua mãe, logo ao nascer. E o bispo africano, como Agostinho, no século IV, Quodvultdeus, escreveu sobre os catecúmenos: "Vós não sois ainda nascidos novamente pelo batismo, mas pelo sinal da cruz fostes concebidos no seio da Igreja" (Sobre o Símbolo I,1).


         Em algum momento o sinal da cruz passou a fazer parte também do cotidiano das pessoas que se benziam frequentemente com ele. E isso deve ter ocorrido bem cedo na história do cristianismo. Nosso testemunho escrito mais antigo e inconteste parece ser Tertuliano, que nasceu em Cartago, no norte da África, antes de 160 e morreu, no mais tardar, em 220. Tertuliano escreveu em De Corona:


         "Em cada caminhada e movimento, em cada entrada e saída, no vestir, no calçar, no banho, no estar à mesa, no acender as luzes, no deitar, no sentar, no lidar com qualquer ocupação, marcamos a testa com o sinal da cruz" (III,4).


         O sinal da cruz, ao menos para nós (porque encontramos sinais semelhantes em culturas e religiões anteriores ao cristianismo), faz uma referência natural à cruz, instrumento de tortura e execução de morte, no qual padeceu Jesus. Mas é bom saber que este sinal variou muito ao longo da história, bem como sua interpretação e uso. No momento de sua origem, parece que era apenas um pequeno sinal feito na testa. Já a obra Odes de Salomão e Justino, do segundo século, faz alusão a esta assinalação. Com o decorrer do tempo apareceu o grande sinal da cruz, como o fazemos ainda hoje, que vai da testa ao peito e do ombro esquerdo ao direito, ao menos no Ocidente. É provável que tenha surgido como gesto de bênção ou de exorcismo. Além de fazer o sinal da cruz, é possível que muitos cristãos o trouxessem como marca na testa, feito como pintura ou tatuagem. Cirilo de Jerusalém, em uma de suas catequeses aos catecúmenos de Jerusalém, em meados do século IV, afirmou:


         "Não nos envergonhemos, pois, de confessar o Crucificado. Na fronte com desassombro façamos com os dedos o sinal da cruz, e tracemos a cruz em tudo: sobre o pão que comemos, sobre o cálice que bebemos; à saída e à volta; antes de dormir; ao deitar e ao levantar; ao andar e ao descansar. É uma grande proteção: gratuita, por causa dos pobres; fácil, por causa dos fracos. De Deus vem a graça. A cruz é o sinal dos crentes e o terror dos demônios, pois os expôs publicamente à vergonha, arrastando-os em cortejo triunfal. Quando vêem a cruz, lembram-se do Crucificado. Temem quem esmagou as cabeças do dragão. Não desprezes, por ser gratuito, este sinal; antes por este motivo honra tanto mais o benfeitor" (Catequeses pré-batismais XIII, 36).


Artigo de Padre Belini, colunista do Jornal Servindo